Visualizações de páginas da semana passada

quarta-feira, 24 de agosto de 2011

Rebelião no Chile: Movimento dos estudantes ganha apoio e marca novas manifestações

Por Bárbara Mengardo

Enviada Especial

Santiago (Chile) – Santiago está em ebulição. Em todos os cantos da capital chilena, a qualquer hora é possível encontrar pixações, eventos culturais e atividades de apoio às manifestações que se estendem há três meses por todo o país, e não se limitam mais às demandas dos estudantes.

O movimento cresceu tanto, e tem tanto apoio popular (o jornal La Tercera, que há meses tenta esconder e desqualificar as movimentações, publicou matéria no último sábado afirmando que 76% da população chilena apóia os protestos), que é impossível saber com exatidão quais atividades vão ocorrer pela cidade.

A praça Ñuñoa, localizada a mais ou menos meia hora do centro de Santiago, em um bairro de classe média, é palco todas as noites de manifestações e confrontos com os carabineiros. Cerca de 3.000 pessoas se deslocam diariamente ao local para participar de panelaços e, geralmente, são recebidos pela polícia que se utiliza de gás lacrimogênio e jatos fortes de água para tentar interromper as atividades.

Esses carros que descarregam água na multidão foram apelidados pela população de Guanacos, que são animais parecidos com Lhamas que vivem nos Andes, e costumam a cuspir nas pessoas. Catalina Gamboa, estudante secundarista que acompanhava uma das manifestações na praça Ñuñoa, explica que o líquido expelido pelos Guanacos da polícia não é apenas água “Quando isso cai no rosto arde. Fizeram algumas análises e viram que tinham fezes nessa água”.

Nos sites das Federações de estudantes brotam relatos de casos de extrema violência policial aplicada pelos Carabineiros. O portal da Federação de Estudantes da Universidade de Valparaiso postou a história de um estudante de História que foi pego por policiais enquanto observava um confronto e levado para um ônibus, onde foi violentamente golpeado.

As agressões resultaram em uma grave fratura nasal, e o estudante necessitou de uma cirurgia. Quando viu a gravidade do machucado, um dos policiais, conta o site, perguntou: “O que se passou filho, porque está sangrando?” o garoto respondeu que eles o haviam agredido, e ouviu a resposta “Nós não batemos em ninguém, você sozinho bateu em uma porta”.

As manifestações, entretanto, não estão presentes apenas nos bairros mais ricos da cidade. Ocupações em universidades e colégios de ensino médio e fundamental se estendem também pela periferia. Estudantes estimam que cerca de 700 colégios estejam ocupados, 200 deles só na capital.

Já no ensino superior ninguém soube dizer quantas ocupações estão em andamento no Chile. Sabe-se que todas as universidade chamadas tradicionais, que foram criadas até a década de 1960 e eram gratuitas até o regime ditatorial de Augusto Pinochet (1973-1990), estão ocupadas ou paralizadas. Andando pelas ruas de Santiago, entretanto, é possível se deparar com dezenas de universidades públicas ou privadas cujos portões estão bloqueados por cadeiras ou os muros estão cobertos com cartazes com dizeres como “fim ao lucro”.

Isso porque, na educação superior chilena, o lucro foi proibido durante a ditadura, com uma lei que instituía que todas as universidades, públicas ou privadas, seriam pagas, mas não poderiam obter lucro.

Atualmente, todas as universidades chilenas são pagas, e a maioria recebe ajuda financeira do governo. Neste cenário, muitos donos de universidades acharam brechas na lei, e obtém muito lucro com as instituições de ensino. É comum que os integrantes dos diretórios acadêmicos, que estão acima dos reitores, possuam também imobiliárias, e repassem dinheiro a partir de obras superfaturadas.

O fim do lucro se tornou uma das principais reivindicações dos estudantes que começaram a realizar marchas e manifestações desde junho. A esse ponto somaram-se muitos outros, sendo um dos principais a educação gratuita e de qualidade que, para todos os atores do movimento que já é conhecido como “inverno chileno”, deve acompanhar uma reforma integral da educação no país.

Sobre o assunto, a Federação dos Estudantes da Universidade do Chile, que tem sido muito ativa durante as manifestações, afirmou em um documento onde reúne todas as pautas do movimeno estudantil: “Nos une a firme convicção de que a educação é um componente essencial para alcançar um novo projeto histórico de desenvolvimento democrático que tanto anseia o país para superar as escandalosas brechas de desigualdade que presenciamos hoje. Desta forma, foi exposta a necessidade urgente de recuperar a educação como um direito social e humano universal que deve ser garantido pela Constituição Chilena.”

Outras demandas importantes são a criação de um novo sistema de financiamento, pois o atual faz com que cerca de 40% dos estudantes deixem as universidades endividados e a desmunicipalização da educação, já que Pinochet desmantelou o Ministério da Educacao, passando a responsabilidade administrativa e financeira para as comunas, que, grosso modo, podem ser comparadas a subprefeituras. Esse sistema faz com que a distribuição de verbas seja desigual entre as comunas.

Atualmente, entretanto, não são só os estudantes que pautam suas reivindicações. No dia 8 deste mês, os trabalhadores do Banco de Santiago começaram uma greve por reajustes salariais, e nos últimos meses ocorreram também paralisações de mineiros e taxistas.

Um hospital público de Santiago, Posta Central, interrompe suas atividades toda vez que ocorrem marchas, e são convocadas também panelaços nos quais muitos adultos e idosos batem panelas para manifestar seu apoio aos estudantes.

Até agora, o governo ainda não apresentou nenhuma proposta satisfatória para os manifestantes. A última tentativa, de estabelcer uma mesa de diálogo com o Congresso, foi rechaçada pelos estudantes universitários, mas bem vista pelos secundaristas. Muitos setores que compõem a ala universitária do movimento acreditam que a melhor solução para o impasse colocado é a realização de um plebiscito, e não veem essa mesa de diálogo como capaz de realizar a mudanca estrutural que desejam.

Desta forma, seguem as mobilizações no Chile, e já está fechado um calendário nacional de mobilizações para as próximas semanas. No dia 16 está marcada uma “velaton”, e todos que apóiam o movimento devem colocar velas em suas janelas. Na quinta, dia 18, acontecerá uma jornada de protesto nacional, e estão marcadas marchas e panelaços. Nos dias 24 e 25 haverá uma greve geral, puxada pela CUT (Central Unitária dos Trabalhadores do Chile).

Em Santiago, está marcado um bem humorado protesto na Praça das Armas, no qual todos deverão se reunir para fazer um grande “iiiiiiiii” pela educação, fazendo referência ao prefeito da comuna de Santiago, Pablo Zalaquett, que, devido a um tique, utiliza essas vogais no meio de suas frases.

O governo também se diz preocupado com a possibilidade dos estudantes perderem o ano. Quanto a isso, Patricio Perez, 16 anos, estudante de um colégio ocupado, responde com uma frase que muito está se ouvindo: “Perder o ano, mas ganhar o futuro”.


Fonte: Correio Caros Amigos

segunda-feira, 22 de agosto de 2011

JMJ: Papa pede que jovens fiquem junto dos pobres

     

MADRI - Ao final da via-sacra que presidiu nesta sexta-feira, às 19:30h (14:30 horário de Brasília), na praça Cibeles, em Madri, o papa Bento XVI pediu aos jovens que sejam animados pelo amor de Cristo a “permanecer junto aos menos favorecidos”.
“Vós, que sois tão sensíveis à idéia de partilhar a vida co os outros, não passeis ao lardo quando virdes o sofrimento humano, pois é aí que Deus vos espera para dardes o melhor de vós mesmos: a vossa capacidade de amar e de vos compadecerdes”, disse o papa.
Bento XVI disse que Deus não está alheio ao sofrimento humano. “A  paixão de Cristo incita-nos a carregar sobre nossos ombros o sofrimento do mundo, com a certeza de que Deus não é alguém distante ou alheio ao homem e às suas vicissitudes”.
O papa recordou, ainda, os elementos fundamentais de humanidade que devem marcar a vida das pessoas. “Sofrer com o outro, pelos outros; sofrer por amor da verdade e da justiça; sofrer por causa do amor e para se tornar uma pessoa que ama verdadeiramente: estes são os elementos fundamentais de humanidade, o seu abandono destruiria o mesmo homem”, disse, citando sua encíclica Spe Salvi.
O trajeto da via-sacra ficou tomado pela multidão de jovens que participam da 26ª Jornada Mundial da Juventude na capital espanhola desde terça-feira, 16. Nas estações foram colocadas imagens do acervo artístico espanhol, as mesmas usadas na Semana Santa.
Durante a via-sacra, a cruz foi levada por jovens que têm algum tipo deficiência. Eles vieram da Terra Santa, Iraque, Albânia, Ruanda e Burundi, Sudão, Japão, Haiti, dentre outros.

Fonte: Boletim Diário da CNBB - 19 de agosto de 2011.

quinta-feira, 18 de agosto de 2011

As possíveis causas dos distúrbios no Reino Unido


Da decadência moral à exclusão social, passando pelo racismo, pelo consumismo e mesmo pela falta da figura do pai nas famílias. Teorias discutidas no Reino Unido procuram explicar as causas dos distúrbios

Maria Luiza Rolim (www.expresso.pt)jornais britânicos e BBC
Deixe aqui o seu comentário















Edifício com 140 anos a arder em Croydon, Londres, no terceiro dia de tumultos
Edifício com 140 anos a arder em Croydon, Londres, no terceiro dia de tumultos

Especialistas e jornalistas britânicos estão a tentar encontrar explicações para a onda de violência de que o país foi palco nos últimos dias. As teorias sobre as possíveis causas do fenómeno vão da decadência moral ao consumismo excessivo, passando, entre outras, pelo racismo, pela exclusão social, pela falta de um modelo masculino na família, cortes nos gastos e fraco policiamento. 


David Wilson, professor de criminologia da Birmingham City University, afirma que existe "uma cultura de merecimento na Grã-Bretanha" que,  segundo ele, "não se limita à classe baixa, sendo comum entre os políticos, os banqueiros, os jogadores de futebol". 
"Não é uma classe em particular apenas, permeia todas as camadas da sociedade. Quando vemos políticos a pedirem TV de plasma e a serem detidos por fraudarem as despesas, fica claro que os jovens de todas as classes sociais estão sem uma liderança apropriada", disse.

Exclusão social


Para Camila Batmanghelidj, a questão da exclusão social não explica tudo mas é importante e deve ser considerada. Num artigo publicado no jornal "The Independent", a fundadora da organização de soliedariedade Kids Company escreveu que existe uma perceção de que a comunidade europeia não dá nada à população.
 "...Não se trata de ataque ocasional contra a dignidade. É a humilhação repetida, ser continuamente desprovido numa sociedade rica", acrescentou.
De acordo com Marian FitzGerald, professora convidada de criminologia na Univrsidade de Kent, a exclusão social pode ser um fator, mas "os excluídos sociais nem sempre são os que causam os distúrbios. Na verdade, geralmente eles até são os mais vulneráveis aos tumultos. Precisamos de uma abordagem mais aprofundada, ao invés de apenas usar a exclusão social como desculpa".

Cortes do Governo


O candidato do Partido Trabalhista à Câmara Municipal de Londres, por sua vez, sugeriu em entrevista à BBC que as medidas de austeridade do Governo são as verdadeiras responsáveis pelos distúrbios. "Se o Governo está a fazer cortes na área da segurança, há sempre margem para este tipo de revolta", afirmou Ken Livingstone.
Mas, na opinião da professora Marian FitzGerald, ainda é muito cedo para estabelecer esse tipo de relação. Isto porque "os cortes que vão ter maior impacto nessa área ainda não estão totalmente executados e só serão sentidos no próximo ano".
"No entanto", admitiu, "pode ser que, devido à muita informação sobre a falta de meios da polícia, os causadores dos tumultos tenham assimilado que a probabilidade de detenção seria pequena".
Um editorial do tablóide "The Sun"  considerou "loucura" o facto de os canhões de água não terem sido disponibilizados à polícia, acrescentando que "o Parlamento não deve ser sensível" ao uso de gás lacrimogéneo e munição não-letal.

Policiamento e cultura do rap


Foi também discutido o impacto das críticas à resposta da polícia aos protestos durante a reunião do G20 em Londres, em 2009, quando alguns comentaristas sugeriram que a polícia teve medo de enfrentar os saqueadores diretamente por recear processos na justiça.
O professor David Wilson defende que se os saqueadores tivessem encontrado uma patrulha policial mais forte, isso podia ter feito a diferença. "Vários deles que foram entrevistados admitiram claramente gostar do sentimento de poder. Foram estimulados a sentir que as cidades lhes pertencem", disse. No entanto, não acho que a questão esteja relacionada com a falta de policiamento correto. O que tem caracterizado a Justiça britânica nos últimos 25 ou 30 anos é o grande número de jovens que são mandados para a prisão, em comparação com os nossos vizinhos europeus".
O jornalista britânico Paul Routledge culpou a cultura do rap pela onda de violência e pelos protestos que tiveram lugar no Reino Unido nos últimos dias. 
Num artigo publicado no "Daily Mirror", Routledge escreveu que a "cultura perniciosa do ódio à volta da música rap" é a fonte dos problemas no país, afirmando que este estilo de música "glorifica a violência e o ataque à autoridade (especialmente a polícia, mas inclui os pais), exalta o materialismo e delira sobre as drogas".
"As coisas importantes na vida são o último smartphone, os ténis, as calças da moda e jogos de computador idiotas. Não admira que as lojas que os vendem sejam os alvos principais", acrescentou, pedindo, por fim, que o "rap venenoso" seja banido. 
Os comentários do jornalista britânico provocaram a reação imediata do rapper Professor Green, no Twitter: "Paul Routlege é completamente burro. Isso, banam o rap, silenciem as nossas vozes ainda mais. Estúpido ignorante! Aceitar responsabilidades? Nem a minha música nem a dos meus pares tem culpa da sociedade e dos seus defeitos. Não fomos nós que criámos os estratos sociais".

Consumismo...


A colunista e jornalista Zoe Williams, referindo-se às mercadorias apreendidas pela polícia depois dos distúrbios, afirmou ao jornal "The Guardian" que os saques aos centros comerciais foram caracterizados pelas escolhas dos consumidores.
"Isto é o que acontece quando as pessoas não têm nada, quando as coisas que não podem pagar são constantemente "esfregadas na sua cara" sem que tenham motivo para acreditar que alguma vez na vida as vão poder adquirir", disse. 
A professora Marian FitzGerald disse que em estudos sobre crimes urbanos este é um fator a ter em conta.
Nos distúrbios recentes, além de roupas, ténis e telemóveis, foram também roubadas latas de cerveja e doces.

... oportunismo


Há também quem defenda a teoria do oportunismo, como escreveu Carolina Bracken no jornal "The Irish Times": "Enquanto mais e mais pessoas se iam envolvendo nos distúrbios, outras tentaram juntar-se-lhes, confiantes de que num mar de gente poucas são as probabilidade de se ser detido ou responsabilizado".
Opinião semelhante tem a professora FitzGerald, para quem "oportunismo misturado com o sentimento de se fazer parte de um grande gangue poderão ter estimulado (a participar) quem normalmente nunca o faria".
"Também é significativo o sentimento de invulnerabilidade por fazer parte de algo tão grandioso. E ainda apela ao sentimento de transgressão e de poder numa sociedade e numa cultura em que esse poder quase não existe", disse.

...ou racismo


A violência em Londres começou no bairro de Tottenham, no passado sábado, depois de ter sido morto pela polícia um negro de 29 anos, Mark Duggan.
Christina Paterson, do jornal "The Independent", defende que a questão do racismo não pode ser negligenciada. "Muitos negros foram mortos pela polícia britãnica. Muitos homens e mulheres foram tratados como criminosos quando o não eram. Não será esta a única causa dos distúrbios, mas está lá à mistura", disse.
A professora Marian FitzGerald minimiza a questão, afirmando que as mortes nas mãos da polícia britânica são muito raras. "Segundo relatórios do IPCC (comissão que observa o trabalho policial),  nos últimos três anos ocorreram apenas sete, e todas de pessoas brancas", disse.
E continua: "A Polícia Metropolitana de Londres (Met police) passou por grandes mudanças de atitude  desde a publicação do "Macpherson report" , em 1999, sobre as relações entre as comunidades das minorias étnicas e a Met police.
Sir William Macpherson - que  acompanhou as investigações da polícia sobre a morte do estudante Stephen Lawrence, de 18 anos - disse então na sua intervanção que o abuso por parte da polícia do poder de detenção levou a que jovens negros responsáveis e cumpridores da lei entrassem em confrontos com as autoridades.

Ausência do pai


Outra causa apontada para os distúrbios em Inglaterra foi a falta de um modelo masculino nas famílias monoparentais, como observou Cristina Odone, do jornal "Daily Telegraph": "Como a esmagadora maioria dos jovens criminosos presos, os membros dos gangues têm uma coisa em comum: não há um pai nas suas casas".
Opinião diferente tem Marian FitzGerald, que afirmou ter criado dois filhos sozinha. "É verdade que existem algumas questões sobre onde os rapazes vão buscar o sentido positivo da masculinidade quando não têm em casa o pai para dar o exemplo. No entanto, se se trata de uma família estável, então as crianças podem, ainda assim, ser bem-sucedidas", disse.

Ler mais: http://aeiou.expresso.pt/as-causas-dos-disturbios-no-reino-unido=f667735#ixzz1VO9Ebb49

Revolta inglesa tem rosto jovem, desiludido e desafiador


Para a oposição, cortes em programas sociais ampliam frustração e servem de gatilho para violência | Foto: Emma LB/Flickr

Igor Natusch

“Continuarei até que me peguem. Quando voltar para casa, nada vai me acontecer”. A frase, pronunciada por um jovem não identificado de Manchester em depoimento à rede BBC, tem sido reproduzida como uma espécie de resumo da atitude niilista por trás dos distúrbios que movimentam o Reino Unido há quase uma semana. Em resposta, o governo britânico acena com um contra-ataque que prevê exibição pela TV de imagens de supostos participantes, mesmo que eventualmente sejam menores de idade. Enquanto a tensão continua sendo a tônica no país, surgem os primeiros esforços para entender as motivações de uma revolta tão destrutiva, que assume o rosto de uma juventude desencantada e desafiadora.

Grupos de oposição acusam a prefeitura de Londres e o governo britânico de promoverem cortes em programas sociais para jovens de comunidades carentes, além de fechar serviços considerados não essenciais, como os que ofereciam opções de lazer para a juventude. Na opinião dos críticos, o plano de austeridade do Reino Unido está sacrificando vários setores da sociedade, o que amplia o sentimento de frustração e acaba servindo de gatilho para ações violentas. O contexto econômico do Reino Unido não é dos mais fáceis, com sinais de desaceleração e apenas 0,2% de crescimento no segundo trimestre deste ano.
Para a polícia britânica, trata-se de “criminalidade contagiosa”. Na visão do primeiro-ministro do Reino Unido, David Cameron, é uma tentativa de instaurar a “cultura do medo” nas ruas. “O contra-ataque é necessário e está sendo preparado”, garante o premiê. “Imagem por imagem, esses criminosos estão sendo identificados e presos. Não vamos permitir que preocupações fajutas com direitos humanos impeçam a publicação das imagens e a prisão de todos os envolvidos”, acentuou Cameron, após reunião de emergência na quarta-feira (10).

É preciso impor autoridade, diz prefeito de Londres
“Há uma ausência de limites e uma ausência de respeito”, acrescentou o prefeito de Londres, Boris Johnson. Integrante da ala conservadora, Johnson alega que a sensação de impunidade entre os jovens acaba sendo um incentivo para ações fora da lei. “Precisamos devolver aos pais e aos professores o direito de impor sua autoridade perante os mais jovens”, argumentou.

David Cameron: "não vamos permitir que preocupações fajutas com direitos humanos impeçam a publicação das imagens e a prisão de todos os envolvidos" | Foto: Hozinja/Flickr

A tendência é que a repressão aos revoltosos ganhe um tom ainda mais severo. Chegou-se a cogitar o uso de força militar nas ruas de Londres – opção descartada pela ministra do Interior da Grã-Bretanha, Theresa May. A intervenção militar era cogitada especialmente no uso de canhões de água, cujo uso em território britânico não é aprovado pelo Ministério do Interior. Mesmo assim, a ministra manteve a mesma postura incisiva do primeiro-ministro e do prefeito. “Vamos deixar bem claro: não há desculpa para a violência, não há desculpa para os saques, não há desculpa para o comportamento agressivo dessas pessoas”.
Alguns analistas parecem concordar, se não com a postura do governo inglês, com a leitura de que não há conteúdo político por trás do prédios incendiados e lojas saqueadas. “Podem existir causas políticas e econômicas, mas não é possível dizer que se trata de uma revolta política”, diz Carina O’Reilly, analista de segurança europeia da IHS Jane’s, ouvida pela Reuters. “São ações criminosas. Você tem pessoas jovens – em alguns casos, muito jovens – que estão revoltadas e vivem na pobreza, e que parecem ter descoberto que podem fazer essas coisas e escapar de punição”.

“Dois meses atrás, nós marchamos até a Scotland Yard, e não publicaram nem uma palavra na imprensa. Agora, olhem ao seu redor” | Foto: Emma LB/Flickr

“Se não há revolta, não nos ouvem”
Do ponto de vista dos revoltosos, no entanto, a situação ganha outro contorno. Entrevistado por uma rede britânica de TV, um dos participantes dos distúrbios garantiu que as ações violentas eram necessárias. “Se não estivéssemos fazendo uma revolta, vocês não estariam aqui me ouvindo, não é?”, perguntou. “Dois meses atrás, nós marchamos até a Scotland Yard, mais de duas mil pessoas, todas vestidas de preto, tudo calmo e pacífico e quer saber? Nem uma palavra na imprensa. Na noite passada, bastou um pouco de revolta e saques, e agora olhem ao seu redor”. A manifestação citada refere-se à morte de Smiley Culture, um cantor de reggae britânico morto em casa durante uma batida policial.
Entrevistado pela agência de notícias EFE, o sociólogo Paul Bagguley, da Universidade de Leeds, diz que há uma “enorme variedade” de pessoas participando das ações. “Há pessoas muito jovens, homens e mulheres de todas as etnias, a maioria desempregados. Um dos detidos é um professor de 32 anos, que acabou se envolvendo em um saque”, diz Bagguley. Ainda que não haja uma reivindicação comum aos revoltosos, os distúrbios são reação a uma sociedade excludente. “O povo não tem dinheiro e não pode se dar ao luxo de comprar o que deseja. Além disso, por causa das altas taxas de desemprego, vemos muitos jovens sem nenhuma atividade”.
“Na base de todos esses incidentes, há um sentimento de descontentamento profundo, em especial entre os mais jovens”, reforça Louise Taggart, analista de conjuntura europeia da agência britânica de consultoria AKE. “São os jovens quem têm a energia para ir às ruas e se revoltar, não apenas no Reino Unido, mas em todo o mundo. Se as autoridades não encararem os problemas por trás de tudo que está acontecendo, temo que estejamos prestes a ver muito mais”.

Distúrbios começaram após policiais matarem um negro de 29 anos em bairro pobre de Londres | Foto: hughepaul/Flickr

Sem a mesma bagagem intelectual de ambos, um eletricista chamado Adrian Anthony Burns disse algo semelhante, em entrevista à agência Reuters. “É muito triste tudo isso, mas os garotos não têm trabalho, não têm futuro, e os cortes na economia só pioram tudo. Só está começando”, disse.
Tribunais de Londres fazem plantão noturno
De qualquer modo, a repressão intensa aos envolvidos na onda de saques e depredações deve continuar. Quatro tribunais de Londres estão fazendo plantão noturno para julgar mais rapidamente pessoas acusadas de ligação com os distúrbios. Vários casos estão sendo encaminhados para a Corte da Coroa, tribunal superior de primeira instância, ao invés de irem para a Corte dos Magistrados, que mais comumente recebe casos de roubo e depredação de patrimônio público. A medida é, na verdade, um recado aos que tomam parte nos incidentes: dotada de maiores poderes, a Corte da Coroa pode sentenciar réus a até dez anos de prisão, enquanto os magistrados aplicam penas de no máximo seis meses.
A onda de violência começou após um protesto pela morte de Mark Duggan, de 29 anos. O homem, negro e morador de Tottenham, em Londres, foi morto por policiais no último dia 4. Os policiais, que investigavam crimes com armas de fogo no bairro, dizem que Duggan era um traficante de drogas e que ele reagiu a tiros à aproximação. A versão dos policiais foi descartada pela corregedoria que investiga o caso, que afirmou não haver indícios de que a arma encontrada na cena do crime tenha disparado.

sábado, 13 de agosto de 2011

Alento aos desolados com a Igreja

Leonardo Boff
 
Atualmente há muita desolação com referência à Igreja Católica institucional. Verifica-se uma dupla emigração: uma exterior, pessoas que abandonam concretamente a Igreja e outra interior, as que permanecem nela mas não a sentem mais como um lar espiritual. Continuam a crer apesar da Igreja.
E não é para menos. O atual Papa tomou algumas iniciativas radicais que dividiram o corpo eclesial. Assumiu uma rota de confronto com dois importantes episcopados, o alemão e francês, ao introduzir a missa em latim; elaborou uma esdrúxula reconciliação com a Igreja cismática dos seguidores de Lefebvre; esvaziou as principais intuições renovadoras do Concílio Vaticano II, especialmente o ecumenismo, negando, ofensivamente, o título de “Igreja” às demais Igrejas que não sejam a Católica e a Ortodoxa; ainda como Cardeal mostrou-se gravemente leniente com os pedófilos; sua relação para com a AIDs beira os limites da desumanidade. A atual Igreja Católica mergulhou num inverno rigoroso. A base social de apoio ao modelo velhista do atual Papa é constituída por grupos conservadores, mais interessados nas performances mediáticas, na lógica do mercado, do que propor uma mensagem adequada aos graves problemas atuais. Oferecem um “cristianismo-prozac”,apto para anestesiar consciências angustiadas, mas alienado face à humanidade sofredora e às injustiças mundiais e a situação degradada da Terra.
Urge animar estes cristãos em vias de emigração com aquilo que é essencial ao Cristianismo. Seguramente não é a Igreja que não foi objeto da pregação de Jesus. Ele anunciou um sonho, o Reino de Deus, em contraposição com o Reino de César, Reino de Deus que representa uma revolução absoluta das relações desde as individuais até as divinas e cósmicas.
O Cristiansimo compareceu primeiramente na história como movimento e como o caminho de Cristo. Ele é anterior a sua sedimentação nos quatro evangelhos e nas doutrinas. O caráter de caminho espiritual é um tipo de cristianismo que possui seu próprio curso. Geralmente vive à margem e, às vezes, em distância crítica da instituição oficial. Mas nasce e se alimenta do permanente fascínio pela figura e pela mensagem libertária e espiritual de Jesus de Nazaré. Inicialmente tido como “heresia dos Nazarenos” (At 24,5) ou simplesmente “heresia” (At 28,22) no sentido de “grupelho”, o Cristianismo foi lentamente ganhando autonomia até seus seguidores, nos Atos dos Apóstolos (11,36), serem chamados de “cristãos.”
O movimento de Jesus certamente é a força mais vigorosa do Cristianismo, mais que as Igrejas, por não estar enquadrado nas instituições ou aprisionado em doutrinas e dogmas. É composto por todo tipo de gente, das mais variadas culturas e tradições, até por agnósticos e ateus que se deixam tocar pela figura corajosa de Jesus, pelo sonho que anunciou, um Reino de amor e de liberdade, por sua ética de amor incondicional, especialmente aos pobres e aos oprimidos e pela forma como assumiu o drama humano, no meio de humilhações, torturas e da execução na cruz. Apresentou uma imagem de Deus tão íntima e amiga da vida, que é difícil furtar-se a ela até por quem não crê em Deus. Muitos chegam a dizer: “se existe um Deus, este deve ser aquele que traz os traços do Deus de Jesus”.
Esse cristianismo como caminho espiritual é o que realmente conta. No entanto, de movimento, ele muito cedo ganhou a forma de instituição religiosa com vários modos de organização. Em seu seio se elaboraram as várias interpretações da figura de Jesus que se transformaram em doutrinas e foram recolhidas pelos atuais evangelhos. As igrejas, ao assumirem caráter institucional, estabeleceram critérios de pertença e de exclusão, doutrinas como referência identitária e ritos próprios de celebrar. Quem explica tal fenômeno é a sociologia e não a teologia. A instituição sempre vive em tensão com o caminho espiritual. Ótimo quando caminham juntas, mas é raro. O decisivo é, no entanto, o caminho espiritual. Este tem a força de alimentar uma visão espiritual da vida e de animar o sentido da caminhada humana.
O problemátio na Igreja romano-católica é sua pretensão de ser a única verdadeira. O correto é todas as igrejas se reconhecerem mutuamente, pois todas revelam dimensões diferentes e complementares do Nazareno. O importante é que o cristianismo mantenha seu caráter de caminho espiritual. É ele que pode sustentar a tantos cristãos e cristãs face à mediocridade lamentável e à irrelevância histórica em que caiu a Igreja atual.

quarta-feira, 27 de julho de 2011

Promotoria denuncia três suspeitos de matar extrativistas no PA

27/07/2011- Folha On Line

FELIPE LUCHETE

DE BELÉM

O Ministério Público do Pará ofereceu denúncia (acusação formal) nesta quarta-feira contra os suspeitos de matar em maio o casal de extrativistas José Claudio Ribeiro da Silva e Maria do Espírito Santo.
O casal foi morto a tiros no assentamento onde moravam em Nova Ipixuna, no sudoeste do Pará, em maio.
O inquérito policial sobre o crime, entregue à Justiça na semana passada, aponta como mandante José Rodrigues Moreira, 42, dono de terras no assentamento onde o casal vivia. O irmão dele, Lindonjonson Silva Rocha, 29, é suspeito da execução, com ajuda de Alberto Lopes do Nascimento, 29.
A promotora de justiça Amanda Luciana Lobato denunciou Rodrigues sob acusação de homicídio duplamente qualificado. Os outros dois foram acusados de cometer homicídio triplamente qualificado. Segundo a polícia, eles não têm advogado.
A Promotoria pediu a prisão preventiva dos suspeitos, "pois, soltos, (...) poderão sumir com provas e ameaçar testemunhas". O processo será encaminhado agora ao juiz Murilo Lemos Simão, da comarca de Marabá.
Durante as investigações, a polícia já havia feito dois pedidos de prisão, ambos negados pelo juiz. Na segunda-feira (25), a família dos extrativistas e movimentos sociais divulgaram nota criticando a atitude dele.
Hoje, a Associação dos Magistrados do Pará disse em nota que Simão, "magistrado sem qualquer mácula", conhece os conflitos agrários da região, mas não pode "proferir decisões que, de acordo com seu entendimento, não encontram respaldo no ordenamento jurídico".
Na terça-feira, o juiz divulgou uma nota negando que suas decisões tenham ajudado na fuga dos três suspeitos do crime.

France Presse
José Claudio Ribeiro da Silva e Maria do Espírito Santo da Silva foram mortos em 24 de maio
José Claudio Ribeiro da Silva e Maria do Espírito Santo da Silva foram mortos em 24 de maio              

terça-feira, 26 de julho de 2011

Ateus espalham outdoors polêmicos em ruas de Porto Alegre (RS)

26/07/2011 - 11h47

FELIPE BÄCHTOLD
DE PORTO ALEGRE

"Religião não define caráter." "Somos todos ateus com os deuses dos outros." Com mensagens como essas, outdoors elaborados por uma associação que reúne ateus começaram a ser espalhados por Porto Alegre.
O objetivo, segundo a entidade, é combater o preconceito contra quem não acredita em nenhum deus. A campanha já vinha sendo realizada em diversos países, com anúncios em ônibus, há dois anos.
No Brasil, a Associação Brasileira de Ateus e Agnósticos diz que empresas de transporte de Porto Alegre, Salvador, Florianópolis e São Paulo rejeitaram a proposta de publicidade, feita no final do ano passado.
Os motivos alegados eram desde conteúdo ofensivo até o veto a mensagens que estimulem a "discriminação de credo". "Chegamos a contratar o serviço. Mas, na última hora, disseram que não ia rolar", conta o presidente da entidade, Daniel Sottomaior.

Reprodução
Imagem divulgada em outdoors na cidade de Porto Alegre, no Rio Grande do Sul; mensagem causa polêmica
Imagem divulgada em outdoors na cidade de Porto Alegre, no Rio Grande do Sul; mensagem causa polêmica
A solução encontrada foi usar os outdoors convencionais. Quatro já foram fixados por ruas da capital gaúcha. O gasto, estimado em R$ 7.000, foi bancado por doadores da entidade. Porto Alegre é a primeira capital no país a receber a iniciativa. A expansão para outras cidades vai depender de mais doações.
A campanha gerou polêmica em outros países. Na Inglaterra, em 2009, foram publicadas mensagens dizendo: "Deus provavelmente não existe". A associação brasileira diz que a iniciativa busca a "igualdade plena" entre ateus e religiosos.

Fonte: Folha Online

segunda-feira, 25 de julho de 2011

25 de Julho: Dia de quem cultiva a terra e luta pela vida

Popularmente se diz que o 25 de Julho é o "Dia do Agricultor", mas em muitos locais se diz "Dia do Colono" e ultimamente se recupera um sentido mais original para quem trabalha no campo e se diz que é o "Dia do Camponês". Na verdade o "Dia do Agricultor" é 28 de Julho, data instituída a partir do centenário da criação do Ministério da Agricultura, em 1960, por decreto do presidente Juscelino Kubitschek. Já a data de 25 de Julho, como "Dia do Colono" é uma homenagem aos "colonos" estrangeiros que imigraram ao Brasil no final do século 19 início do século 20.

Mas, hoje, quando se fala em agricultor, colono ou camponês, já se sabe que se refere ao pequeno agricultor, o homem e a mulher que trabalham na agricultura familiar e camponesa. E quando se refere aos grandes, os latifundiários e ruralistas, eles gostam de serem chamados de "produtores rurais". E a imprensa frisa muito bem esta terminologia. De fato eles produzem e muito. Produzem, em primeiro lugar, a fome e a miséria porque roubam a terra de quem dela precisa. Produzem riqueza para eles. Os grandes não cultivam a terra, simplesmente arrancam dela o lucro.

Enquanto o pequeno agricultor, o colono, o camponês cultiva a terra, semeando a boa semente para colher o pão de cada dia que alimenta sua família e nutre o Brasil, o dito produtor rural trabalha com dinheiro e na terra põe o transgênico e o veneno e colhe muito mais dinheiro. Você já viu um produtor rural produzir sem dinheiro? Ele usa dinheiro público para arrancar da terra mais riqueza para ele próprio. Mas o pequeno agricultor, que nem sempre tem recursos para cultivar a terra, trabalha na fé, na coragem e no amor.

Mas, a mulher e o homem que, com simplicidade, cultivam a terra, também são cultivados por ela e aprendem a lutar pela sua dignidade e pelo respeito a vida. Quando pessoas simples e humildes se levantam do chão como plantas que querem florir, é porque a terra cultivou seus corações e mentes e aprenderam na vida que é preciso lutar para viver. Por isso, nesta data, é preciso enaltecer mulheres e o homens que, cultivando a terra, aprendem a lutar.
25 de Julho deve ser um dia para celebrar e lutar, porque a vida do pequeno agricultor, colono ou camponês é marcada pela luta, mas com muita mistica e amor com a terra.
Pilato Pereira - CPT/RS

domingo, 24 de julho de 2011

Romaria no Araguaia termina com luta contra violações


PDF Imprimir E-mail
Seg, 18 de Julho de 2011 13:44
Terras indígenas, reforma agrária, machismo, racismo e barragens unem milhares de pessoas no Mato Grosso para reafirmar a memória de quem dedicou a vida a uma causa. A 5ª Romaria dos Mártires foi realizada nesse fim de semana, 15 e 16 de julho, em Ribeirão Cascalheira (MT).


Por: João Peres, Rede Brasil Atual - (Foto: Douglas Mansur)
Ribeirão Cascalheira (MT) – Uma vela acende a outra, o fogo se multiplica por dois, por quatro, por oito, e logo são milhares as velas acesas nesta cidade do Araguaia. A fé move montanhas, mas velas não andam sozinhas: são muitos os romeiros vindos de outros estados da federação e de países da América do Sul e da Europa.
Na escuridão da noite, reinam as velas, uma imensidão a iluminar o caminho. Crianças, adolescentes, adultos, idosos são atraídos a cada cinco anos a Ribeirão Cascalheira, no Mato Grosso, para celebrar àqueles que entregaram a vida por uma causa. A Romaria dos Mártires da Caminhada não é uma celebração comum. “Não é uma festividade, não é um show. É uma memória martirial”, avisa Dom Pedro Casaldáliga, bispo que tornou famosa a Prelazia de São Félix do Araguaia ao defender ribeirinhos, indígenas, camponesas e todas as vítimas da opressão.
Aos 83 anos, retirado do comando da prelazia, é um mártir vivo desse encontro. Toda a comoção que já havia provocado ao longo do fim de semana se fez ainda mais forte aos fiéis quando afirmou que esta é sua última romaria na Terra, e que a próxima ele irá acompanhar a distância, no céu. Apesar de debilitado pelo Mal de Parkinson, Pedro enfrentou o exaustivo calor da manhã de domingo (17) para participar da celebração e cumprimentar a todos que conseguiram chegar até ele.
É, via de regra, um momento de emoção para quem o saúda. Os romeiros veem em Pedro um exemplo de entrega. Montserrat Calderó é, como o bispo, espanhola. Morando em Goiânia há quatro meses, não quis deixar passar a oportunidade de conhecer a alguém que há muitos anos admira. “Comecei a chorar. Não consegui falar nada, não me vinha nada à cabeça.” Seria difícil tentar explicar a reação de quem cumprimenta este senhor de corpo frágil e pequenino.
Energias
Quem comparece a este encontro garante sair de energias renovadas, mesmo após enfrentar uma viagem cansativa e uma rotina puxada, que inclui procissão de cinco quilômetros na noite de sábado e missa na primeira hora da manhã de domingo. O trabalho é mais árduo para os moradores desta cidade, que juntam forças durante meses para organizar a romaria. Os alimentos são plantados ou comprados pelos próprios, e todas as refeição são partilhadas na praça principal. Tudo coerente com a história da prelazia, que prima pela vida em comunidade, desapegada de bens materiais.
Essa é uma romaria revestida de forte caráter político, a começar pelo mote. O encontro é organizado desde 1986 para celebrar a memória dos mártires, em especial a do padre João Bosco Burnier. Em 1976, ao tentar fazer com que policiais militares dessem fim a uma sessão de tortura contra duas mulheres da comunidade, acabou assassinado.
Gente de vários estados do Brasil tem a oportunidade de conhecer esta história, mantida pela memória oral, e de compartilhar denúncias de violações de direitos humanos, de machismo, de racismo e de deslocamentos forçados. A terra xavante dos indígenas de Mato Grosso é ameaçada por invasores que se escoram na lentidão do Judiciário em encontrar um desfecho para a causa. “Tomaram da gente. Depois de 40 anos voltamos. Com luta, com peito aberto”, conta Carolina Rewwaptu, moradora das terras ameaçadas.
Padre Juquinha, da Comissão de Justiça e Paz da Arquidiocese de Porto Velho, reclama que continuam os maus tratos a trabalhadores das obras da hidrelétrica de Jirau, que há quatro meses se revoltaram. “Muitos são iludidos pelas construtoras a ir para lá, não conseguem emprego e não têm como voltar para casa”, acrescenta. “A romaria é uma maneira de mostrar que ninguém está só nessa luta.”
Luta por justiça
A região do Araguaia, além da questão dos Xavantes, tem problemas com exploração de mão de obra e com disputas fundiárias. Dagnon Odilon da Silva, um jovem de 21 anos, é natural de São José do Xingu, a algumas horas de Ribeirão Cascalheira, uma terra dominada por conflitos pela terra. Segundo ele, há fazendas maiores que municípios e os latifundiários contam com apoio dos poderes locais para manter áreas improdutivas e reprimir movimentos sociais. “As pessoas que cometem essas atrocidades têm poder sobre a mídia. Por que não se divulga nada sobre isso?”, indaga.
Após uma celebração sob o sol forte do Centro-oeste, os romeiros fizeram uma última refeição comunitária e começaram o longo caminho de regresso aos estados. “Devemos renovar nosso compromisso de seguir em caminhada rejeitando tudo quanto seja mentira, corrupção, morte”, aconselhou Pedro. Em cinco anos, tudo começa outra vez.

Fonte: http://www.cptnacional.org.br

sexta-feira, 8 de julho de 2011

A perda de confiança na ordem atual

Leonardo Boff.

Para os especuladores, também no Brasil, o dinheiro serve para produzir mais dinheiro e não para produzir mais bens
07/07/2011
Leonardo Boff
Na perspectiva das grandes maiorias da humanidade, a atual ordem é uma ordem na desordem, produzida e mantida por aquelas forças e países que se beneficiam dela, aumentando seu poder e seus ganhos. Essa desordem se deriva do fato de que a globalização econômica não deu origem a uma globalização política. Não há nenhuma instância ou força que controle a voracidade da globalização econômica. Joseph Stiglitz e Paul Krugman, dois prêmios Nobel em economia, criticam o Presidente Obama por não ter imposto freios aos ladrões de Wall Street e da City, ao invés de se ter rendido a eles. Depois de terem provocado a crise, ainda foram beneficiados com inversões bilionários de dinheiro público. Voltaram, airosos, ao sistema de especulação financeira.
Estes excepcionais economistas são ótimos na análise mas mudos na apresentação de saídas à atual crise. Talvez, como insinuam, por estarem convencidos de que a solução da economia não esteja na economia mas no refazimento das relações sociais destruídas pela economia de mercado, especialmente, a especulativa. Esta é sem compaixão e desprovida de qualquer projeto de mundo, de sociedade e de política. Seu propósito é acumular maximamente, apropriando de bens comuns vitais como água, sementes e solos e destroçado economias nacionais.
Para os especuladores, também no Brasil, o dinheiro serve para produzir mais dinheiro e não para produzir mais bens. Aqui o Governo tem que pagar 150 bilhões de reais anuais pelos empréstimos tomados, enquanto repassa apenas cerca de 60 bilhões para os projetos sociais. Esta disparidade resulta eticamente perversa, consequência do tipo de sociedade a qual nos incorporamos, sociedade essa que colocou, como eixo estruturador central, a economia que de tudo faz mercadoria até da vida.
Não são poucos que sustentam a tese de que estamos num momento dramático de decomposição dos laços sociais. Alain Touraine fala até de fase pós-social ao invés de pós-industrial.
Esta decomposição social se revela por polarizações ou por lógicas opostas: a lógica do capital produtivo cerca de 60 trilhões de dólares/ano e a do capital especulativo, cerca de 600 trilhões de dólares sob a égide do “greed is good” (a cobiça é boa). A lógica dos que defendem a maior lucratividade possível e a dos que lutam pelos direitos da vida, da humanidade e da Terra. A lógica do individualismo que destrói a “casa comum”, aumentando o número dos que não querem mais conviver e a lógica da solidariedade social a partir dos mais vulneráveis. A lógica das elites que fazem as mudanças intrassistêmicas e se apropriam dos lucros e a lógica dos assalariados, ameaçados de desemprego e sem capacidade de intervenção. A lógica da aceleração do crescimento material (o PAC) e a dos limites de cada ecossistema e da própria Terra.
Vigora uma desconfiança generalizada de que deste sistema não poderá vir nada de bom para a humanidade. Estamos indo de mal a pior em todos os itens da vida e da natureza. O futuro depende do cabedal de confiança que os povos depositam em suas capacidades e nas possibilidades da realidade. E esta confiança está minguando dia a dia.
Estamos nos confrontando com esse dilema: ou deixamos as coisas correrem assim como estão e então nos afundaremos numa crise abissal ou então nos empenharemos na gestação de uma nova vida social, capaz de sustentar um outro tipo de civilização. Os vínculos sociais novos não se derivarão nem da técnica nem da política, descoladas da natureza e de uma relação de sinergia com a Terra. Nascerão de um consenso mínimo entre os humanos, a ser ainda construído, ao redor do reconhecimento e do respeito dos direitos da vida, de cada sujeito, da humanidade e da Terra, tida como Gaia e nossa Mãe comum. A essa nova vida social devem servir a técnica, a política, as instituições e os valores do passado. Sobre isso venho pensando e escrevendo já pelo menos há vinte anos. Mas é voz perdida no deserto. “Clamei e salvei a minha alma”(clamavi et salvavi animam meam), diria desolado Marx. Mas importa continuar. O improvável é ainda possível.


Leonardo Boff é autor de Virtudes para um outro mundo possível 3 vol. Vozes 2005.
* Matéria copilada do site:http://www.brasildefato.com.br

quarta-feira, 6 de julho de 2011

Enquanto houver pobre, haverá a teologia da libertação.

Pabro Richard
Que marcas permanecem em Pablo Richard daquele Movimento de Cristãos pelo Socialismo dos anos 1970, que nasceu da chamada Teologia da Libertação?

A Teologia da Libertação foi um movimento muito importante que tornou possível a convergência entre fé e política, porque normalmente os cristãos, quando havia um governo progressista ou socialista, sempre estavam na oposição, e foi a Teologia da Libertação que permitiu que a fé fosse mais libertadora, e correspondeu aos partidos políticos descobrirem que o cristianismo tinha uma orientação libertadora.

Foi a opção que permitiu aos cristãos participarem dos movimentos políticos sem perder a sua fé, o que foi novo, porque antigamente os cristãos que tinham uma opção política normalmente eram de direita, e os partidos de esquerda excluíam os cristãos, em um paralelismo que não se tocava.
A total convicção que fica em mim daquele movimento cristão é que não há nenhuma incompatibilidade entre cristianismo e socialismo, mas em processos concretos, ajudar as e os cristãos a participarem da política sem perder a fé, fé que se radicaliza ao aprofundar na realidade.
Que opinião merece a afirmação de que a Teologia da Libertação foi abortada pelos abruptos rumos da Igreja para a direita na América Latina?

Depende, porque há uma Igreja de “cristandade” que destruiu tudo o que se havia construído nas décadas de 1960 até 1980 e que está cada dia mais à direita. Mas, também existe a Igreja da libertação, das comunidades eclesiais de base, a Igreja dos pobres, que segue estando na linha libertadora e que está cada dia mais viva na América Latina. Na medida em que o sistema neoliberal e a Igreja de cristandade vão entrando em crise, as pessoas buscam uma alternativa, e essa é oferecida pela Teologia da Libertação. Na América Latina, só nos últimos dez anos, saíram 50 milhões da Igreja católica, e não porque foram para outros grupos religiosos, mas porque a Igreja não lhes diz nada. Isso faz parte da crise da “cristandade” que não dá nenhuma resposta aos problemas modernos.

Quando você vislumbra a atual realidade da América Latina, onde são cada vez mais comuns os desastres naturais e as mudanças climáticas que acentuam os níveis de pobreza, além de outros males como a corrupção, a violência e as drogas, como sustentar essa Palavra de Deus, como fonte de vida e esperança, que você anunciava às portas do atual milênio?

Primeiro, deve haver uma análise da realidade, desta economia de mercado de inspiração neoliberal que se mantém graças a salários baixos e destruição da natureza. É certo que há muitos setores da Igreja que estão metidos neste sistema neoliberal, mas há também pessoas que fazem a leitura da Palavra de Deus e grupos bíblicos que estão preocupados com esta crise devido à destruição da natureza.

Leonardo Boff escreveu um livro paradigmático neste sentido: Ecologia: Grito da Terra, grito dos pobres [Sextante, 2004], pois é preciso ouvir a ambos. Então, há muitos movimentos da Teologia da Libertação na linha ecológica. Bem agora há a construção de toda uma teologia sobre a água, como um bem que está a ponto de entrar em crise. Da destruição dos meios naturais e da destruição das pessoas, por este sistema, a Teologia da Libertação é a que mais fala, e muitas vezes nem os grupos políticos nem a Igreja falam disso. O tema ecológico é um tema candente, especialmente na teologia indígena, onde já se fala muito de “Pachamama” na América do Sul, por exemplo, na defesa da terra e da água, onde participam muito os grupos progressistas das igrejas.

Por exemplo, a recente reunião de Cancún sobre as medidas a serem tomadas em relação à mudança climática e ao aquecimento global; que, caso a temperatura subir dois a três graus, haverá catástrofes derivadas dessas mudanças, e os países industrializados não aceitam nem querem tomar medidas, porque proteger a natureza é o pior negócio para eles, pois é preciso reduzir o avanço do mercado, mas eles querem mais e mais lucros e se isso implica em destruição da natureza, o que pouco lhes importa.
Se tudo continuar como está, se não houver mudanças, a terra não chegará ao ano 2025. Abusamos da terra tirando dela mais do que pode dar, mas muitos não se dão conta de que a terra é redonda, e que quando se explora demais, mais adiante ela vai lhe pegar pelas costas. Então, a Igreja desenvolveu uma teologia muito sábia, quando aborda a ecologia, e isto faz parte da Teologia da Libertação.

Em uma de suas últimas análises, “Pedofilia e poder”, você faz afirmações muito arriscadas. Fala em enfrentar a atitude da Igreja católica, por um lado em relação ao fenômeno da pedofilia e, por outro, em relação à Teologia da Libertação. Afirma que a homossexualidade pode ser uma opção legítima se estiver guiada por uma ética de amor e fidelidade e que a exclusão da mulher da estrutura hierárquica católica é o reverso da masculinização absoluta do ministério clerical, chegando a se perguntar como se analisarão estes problemas caso a mulher, ordenada como cardeal, tivesse acesso a altos cargos dentro da estrutura hierárquica da Igreja. Houve alguma reação da cúria romana aos seus posicionamentos ou simplesmente silenciaram?
A Igreja teme falar destes temas. Tem medo. Eu não recebi nenhuma crítica da parte da hierarquia ao artigo, e se deve ao temor que há em relação aos temas.

Atualmente, na ética da Teologia da Libertação aceitamos, por exemplo, que a homossexualidade é um modo de viver, é uma opção. Mas a Igreja e sua hierarquia não entram nestes temas pelo temor de que se desate uma discussão onde não têm muito a dizer, pois são temas que não são discutidos.

Estes são problemas da modernidade e a Igreja católica os rechaçou: não quer saber da homossexualidade ou da participação das mulheres. Em relação a este último, por exemplo, não há um único argumento, nem bíblico nem teológico, para excluir a mulher do sacerdócio e a Igreja o rechaça, porque tem uma visão pré-moderna da mulher.
Enfim, a Igreja não fala muito destes temas, porque não sabe o que dizer, e todas as vezes que entrou, entrou mal, ocultou pedófilos, não ouviu as vítimas, não analisou em profundidade, porque se entrar nesta discussão vão surgir muito mais problemas para a hierarquia por sua posição tão conservadora.

Também no seu espírito do que se poderia chamar de “um provocador teológico”, disse que não existe uma Igreja, mas modelos de como ser Igreja; e se refere a um modelo dominante e tradicional que fenece de maneira irreversível diante de outro que busca, precisamente, um alternativo e mais contextualizado. Na sua opinião, que características ou para onde deve se enfocar esse modelo qualificado por você de emergente?

O modelo da igreja da cristandade já entrou numa forte crise, é irreversível e se aproxima do colapso, porque não tem os elementos nem fundamentos teológicos nem teólogos ou teólogas para superar esta situação. A pedofilia já é um sinal muito sério dessa crise profunda, e pior ainda o ocultamento que a Igreja fez disso. Evidentemente, e embora não como uma consequência direta, as pessoas vão recorrer ao modelo alternativo, vão buscar na Igreja dos pobres uma maneira de viver a sua fé.
Então, esta Igreja emergente, dos pobres, a Igreja do Povo de Deus, deve ter as seguintes características:
 1º.     Opção preferencial pelos pobres e contra a pobreza: é preciso criar estruturas na Igreja para viver com eles (os que vivem com HIV/Aids, os marginalizados, os moradores de rua, etc.). Atualmente, são muitos, mas são invisíveis à sociedade e esta situação é algo que a Igreja deve transformar.
 2º.     Comunidades eclesiais de base: onde se une a oração e a comunidade, não importa que sejam poucos e poucas, o que conta é a qualidade. Para a Igreja da cristandade o importante é a quantidade, porque têm critérios comerciais, de mercado. Me atrevo a dizer que não importa que a Teologia da Libertação morra, contanto que não sigam morrendo os pobres, mas que enquanto houver pobres, haverá Teologia da Libertação, haverá Igreja do Povo de Deus.
 3º.     Leitura popular da Bíblia: o melhor que podemos fazer neste momento de crise é devolver a Bíblia ao povo, com liberdade e autonomia. Durante 400 anos a Igreja esteve sem Bíblia, mas o Concílio Vaticano II rompeu com esta tradição e a devolveu ao povo.
 4º.     Teologia da Libertação: é preciso voltar a fazer teologia. É preciso perder o medo, superar a teologia do medo: os leigos temem o padre, o padre o bispo, o bispo o Vaticano e o Vaticano a Teologia da Libertação... Deve-se deixar o medo de lado e ter fé.
 5º.     Igreja autóctone: é a que nasce dos próprios povos que vão descobrindo o Evangelho.
 6º.     Vida religiosa inserida nos ambientes das e dos marginalizados e desprezados.
 7º.     Novos ministérios: é preciso dessacralizar e “desacerdotizar”, superar distâncias entre leigos e clérigos, que as divisões desapareçam. E aqui exclamar: NUNCA MAIS UMA IGREJA SEM MULHERES! Devem ser integradas como mestras, sábias, teólogas, que assumam todas as funções do presbiterado.
 8º.     Igreja como centros de formação: as e os leigos são o futuro da Igreja, razão pela qual a formação é importante.
 9º.     Igreja de profetas e mártires.
 10º.  Evitar as contradições desnecessárias e crescer onde estão as forças. Não basta criticar e gritar contra a Igreja da cristandade, pois os dois modelos de Igreja não vivem separados e confrontados entre si. Os modelos se entrecruzam. Encontramos sinais da presença de Deus na Igreja da cristandade e sinais de cristandade na Igreja dos pobres.
 Suponhamos que você seja doutor em medicina e tenha que dar um diagnóstico de um doente que, na sua história clínica tem por nome Teologia da Libertação: qual seria seu pulso e sua pressão arterial? Estaria sofrendo de uma dolência passageira, câncer ou seria preciso dar um atestado de óbito no atual contexto político e eclesial da América Latina?

Não poderia dar um prognóstico fatídico, porque, de fato, há um ressurgimento da Teologia da Libertação, embora a Igreja o negue. A leitura popular da Bíblia e as comunidades eclesiais de base são uma força que não podem deter. Os próprios pobres necessitam desta Igreja, necessitam dela para sobreviver. Não é a Igreja que necessita de dinheiro para sobreviver, mas os pobres necessitam da Igreja para sobreviver. E isto se dá em todas as partes, em El Salvador, na Guatemala, na Costa Rica e em muitas outras partes do mundo.